Qual a primeira imagem que vem na sua cabeça quando você pensa na palavra “vampiro”? Se a sua resposta for “The Vampire Diaries” (2009-2017), “Crepúsculo” (2008) e “True Blood” (2008-2014), então as suas maiores referências partem da cultura pop contemporânea. Caso a sua resposta seja “Drácula”, “Família Addams” (1964-1966) e “Entrevista com vampiro” (1994), o seu repertório vem de uma época que foi muito importante para a proliferação midiática da figura do vampiro. Apesar dessas referências audiovisuais, duas coisas são certas: os vampiros estão entre nós (de uma maneira bem distante daquilo que é visto em Hollywood) e esse fenômeno não é de hoje.
A partir dos anos 1970, a comunidade vamp internacional começa a se organizar, conforme outros grupos da vertente esotérica também iam se reunindo. Mas é apenas algumas décadas depois, em meados de 2003, que o movimento passa a se centralizar no Brasil, com o surgimento da Rede Vamp, fundada por Lord A, rei da dinastia Sahjaza. “Naquela época, nos anos 70, você tinha a bruxaria, o wicca e os satanistas se organizando em grupos e comunidades. Alguns anos antes, em 1966, você tem o “satanic panic” das pessoas acontecendo por toda parte, e no meio de tudo isso havia aqueles que encontravam no vampiro a sua figura de poder, o seu arquétipo de poder. E precisamos pontuar que dentro disso a comunidade vampírica vai se organizar em duas vertentes principais, primeiro (quantitativamente maior), o pessoal que aprecia a produção cultural (videogame, cinema, seriados, quadrinhos, história da arte, literatura, folclore) em segundo, o pessoal que encontra ali uma espiritualidade, um processo que oferece uma mística, ou como a gente prefere chamar (para resumir tudo), de cosmovisão vampírica”, conta Lord A.
Lord A já estava inserido dentro desse contexto vampírico, confeccionando e traduzindo textos desse universo, desde os anos 1990. Assim como qualquer atitude que seja diferente do status quo, ele sofreu bastante, especialmente ao tentar esconder a sua espiritualidade dos outros, chegando a passar por uma experiência de quase morte. Após esse episódio traumático, em 2003, ele concluiu: “se for para viver escondendo todo meu vínculo de espiritualidade, de magia, tudo isso que eu sou, só para tentar me encaixar no mundo dos outros, dizendo que eu sou uma coisa que eu não sou, ficar fazendo esse jogo social… eu cansei. Eu quase morri e agora eu quero que se foda! Eu sou um vampiro, eu vivo isso, e fui iniciado nesse meio alguns anos atrás, então tenho o conhecimento, tenho o que partilhar, o que contar, e de agora em diante eu vou publicar tudo”, relata.
Foi nesse impulso que ele decidiu assumir de vez o lado vamp, publicando traduções de obras norte-americanas e textos vampíricos em seu blog, mas o que ele não esperava era a proporção que o seu site iria tomar. “Quando vi, fui parar no noticiário da madrugada, fazendo uma matéria onde eu simplesmente me assumia como vampiro para o hemisfério sul inteiro. Isso foi um negócio explosivo na minha vida. Eu de fato achava que ia aparecer umas cinco, seis pessoas e que pelo menos teriam algumas figuras para conversar sobre o que eu gostava, compartilhar isso, mas quando eu vi, meu site explodiu de visitação”, relembra Lord A.
Um passo importante para aqueles que cultuam a espiritualidade dentro da comunidade foi o surgimento do Círculo Strigoi, que criou uma sociedade discreta voltada para a cosmovisão vampírica, acoplando também a estrutura de estudos e práticas do hermetismo, paganismo e ocultismo. Para poder pleitear uma vaga e se tornar membro do regimento interno, os interessados devem estudar a história e os ritos vampíricos, além de escrever algumas monografias no decorrer dos anos. É importante pontuar que o indivíduo só pode pleitear uma entrada no círculo a partir dos 18 anos, e só depois dos 28 anos que essa pessoa pode se tornar um membro oficialmente.
“Tem toda uma estrutura, tem alma, tem metodologia, há um percurso a ser feito para você poder ascender nesse meio. É sempre legal pontuarmos que existe tudo isso. Não é uma coisa que a pessoa se veste diferente, põe o par de uma lente de contatos, coloca umas presas postiças e sai berrando que é vampiro, né. Espiritualidade vampírica tem éthos, práxis, toda uma estrutura que não foi inventada por nós, ela já está aí há cinco décadas, nós a integramos, somos parte dela. Qualquer pessoa que se interessa por vampiros, que gosta de tudo isso, pode frequentar as nossas reuniões, simplesmente por gostarem e se sentirem bem. Já aqueles que optam por trilhar o caminho da cosmovisão vampírica, carregam um legado espiritual diferente das outras pessoas. E essas pessoas, quando chegam na Dinastia Sahjaza, no Círculo Strigoi, ou nas outras casas que existem, tendem a encontrar uma ressonância, uma experiência sensorial diferente, porque elas percebem que estão entre afins”, afirma Lord A.
“Não é uma coisa que a pessoa se veste diferente, põe o par de uma lente de contatos, coloca umas presas postiças e sai berrando que é vampiro, né. Espiritualidade vampírica tem éthos, práxis, toda uma estrutura que não foi inventada por nós, ela já está aí há cinco décadas, nós a integramos, somos parte dela”
Lord A, rei da dinastia Sahjaza